Fundamentos da Ressonância Magnética Funcional

Por: R. Gattass 1, J. Moll 2, P. A. Andreiuolo 2, M. F. Farias 1 e P. H. Feitosa 1

Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho /UFRJ 1, LABS Exames Complementares em Medicina 2

Fundamentos da Ressonância Magnética Nuclear:

A imagem por ressonância magnética (IRM) é o resultado de sinais de freqüência de rádio liberados por núcleos de peso atômico par quando voltam ao seu estado de repouso depois de serem alinhados por um pulso magnético forte e homogêneo. No cérebro, o núcleo do átomo de hidrogênio da água é a principal fonte de sinal na IRM. A leitura do sinal em momentos distintos permite visualizar diferencialmente substância cinzenta de substância branca e de fluido cérebrospinal. Ossos densos, que contém pouca água, são invisíveis em tais imagens.
 
 

Fundamentos Físicos

O núcleo atômico produz um sinal de IRM da seguinte forma. Quando elementos com um peso atômico par, como o hidrogênio, são expostos a um campo magnético estático, forte e homogêneo, os núcleos dos átomos se comportam como magnetos e seus spins se alinham na direção do campo aplicado (Fig 5a). O alinhamento dos spins dos núcleos pode ser perturbado por um pulso curto de ondas de rádio (RF) que serve para tirar os spins do núcleo de sua orientação paralela ao campo magnético e para fornecer a energia necessária para movimentos do tipo giroscópio dos spins dos núcleos, denominados de precessão. Quando o pulso RF é apagado, o núcleo tende a voltar para sua situação original e, assim fazendo, libera energia em forma de ondas de rádio(Fig.5b) A freqüência dessas ondas de rádio são distintas para diferentes espécies de átomos, assim como para um dado átomo em diferentes meios químicos ou físicos. Portanto, os núcleos ressonantes tornam-se transmissores de ondas de rádio com freqüências características e revelam sua presença no tecido pelos seus sinais RF. Núcleos diferentes absorvem energia de ondas de rádio de freqüência diferente. A habilidade do núcleo atômico de absorver energia de ondas de rádio é denominada ressonância magnética nuclear. O núcleo atômico, tendo absorvido energia pelas ondas de rádio aplicadas externamente, libera esta energia como um sinal ao retornar ao seu estado de menor energia. A taxa com a qual um núcleo volta ao seu estado de energia mais baixa é chamada de relaxação e é inicialmente descrito por sua constante de tempo (T). Há dois tipos de relaxação de importância em IRM: relaxação spin-lattice (rotação-quadratura) ou T1 e relaxação spin-spin (rotação-rotação) ou T2. Para um átomo em particular, esses tempos de relaxação variam de composto para composto. Por exemplo, o hidrogênio tem um tempo de relaxação muito mais curto em lipídios (ou gorduras) do que na água. Tempos de relaxação podem também variar de acordo com a condição local do tecido, tais como, água no fluido cerebrospinal e água no parênquima cerebral. Note que como os tempos de relaxação são influenciados pelas condições locais do tecido, ao enfatizar um tempo de relaxação na imagem pode-se tanto discriminar entre tecidos normais de varias composições, assim como limitar alterações estruturais do tecido causadas por processos patológicos. Por exemplo, a diferença entre substâncias branca e cinzenta é melhor visualizada por imagens que enfatizam T1, enquanto o fluido cerebrospinal é bastante visível em imagens que enfatizam T2. Imagens podem ser geradas para visualizar tanto a distribuição de um tempo específico de relaxação quanto a concentração real de um núcleo atômico em particular. Em IRM melhores contrastes são obtidos para as imagens representando tecidos com tempo de relaxação diferentes do que diferentes concentrações de prótons. Por exemplo, a diferença nos tempos de relaxação das substâncias brancas ou cinzentas e do fluido cerebrospinal são muito maiores que as diferenças entre suas concentrações de prótons (da água) nesses tecidos.

Ressonância Magnética Funcional


 
 

Nos últimos cinco anos a evolução dos magnetos supercondutores usados para a ressonância magnética (RM), das bobinas e das seqüências de pulso com capacidade de gerar altos gradientes com excelente homogeneidade de campo nos três planos, permitiu que a Ressonância Magnética Funcional (RMF) se estabelecesse como uma das ferramentas mais poderosas, rápidas e eficazes no campo da Neurociência.

Com o nascimento dessa técnica surgiu um método não invasivo capaz de mapear funcionalmente as diferentes áreas corticais. Apesar de originalmente descrita como por Belliveau e colaboradores em 1991,como discreta alteração do sinal da área ativada após administração de contraste intravenoso paramagnético, posteriormente os achados foram reproduzidos sem a necessidade desse. A técnica BOLD (blood oxygen level dependent contrast) baseia-se nas propriedades dia ou paramagnéticas da oxi e desoxiemoglobina, respectivamente, e nas variações em suas concentrações relativas nas áreas onde ocorre aumento do fluxo sanguineo (Fig 6) decorrente da ativação neural (Ogawa et al. , 1990, 1993).

O aparecimento recente do mapeamento funcional por ressonância magnética através da manipulação do contraste intrínseco representado pelas propriedades magnéticas da hemoglobina (Fig.6b) permite a detecção de alterações hemodinâmicas locais relacionadas a eventos neurais. A atividade neural acarreta elevação do fluxo sanguineo local por mecanismos que envolvem a liberação de oxido nítrico, um gás vasodilatador difusível (Fig.6c). Como o aumento do aporte de sangue arterial nessa região supera em muito a discreta elevação da extração de oxigênio,pelo tendo que está mais ativada, no balanço final, há um aumento da concentração local de oxihemoglobina, que é diamagnética, em detrimento da redução da concentração de desoxi-hemoglobina. A desoxi-hemoglobina tem propriedade paramagnética, por possuir dois elétrons não pareados, o que gera grande susceptibilidade magnética local, levando a perda de sinal na IMR. O efeito final na imagem consiste em aumento da intensidade do sinal nas áreas ativas, quando as imagens de ativação são subtraídas das de repouso. A magnitude dessa diferença de sinal é pequena, na faixa de 1-5%, e só pode ser determinada após cálculo estatístico da correlação da variação da intensidade do sinal nas fases de controle e estimulação. Essa técnica, BOLD (por ressonância magnética funcional) é a base da maioria das investigações em neurociência. feitas com RMF.

Bibliografia citada:

Belliveau JW, Kennedy DN, McKinstry RC, et al. Functional mapping of the human visual córtex by magnetic resonance imaging. Science 1991: 254:716-719.

Binder JR, Rao SM, Hammeke TA, et al. Lateralized human brain language systems demonstrated by task subtraction functional magnetic resonance imaging. Arch Neurol, vol.52, 1995; 593-601.

Ogawa S, Menon RS, Tank DW, et al. Functional brain mapping by blood oxigenation level-dependent contrast magnetic resonance imaging. Biophys J 1993; 64:803-812.

Ogawa S, Lee TM, Kay AR, et al. Brain magnetic resonance imaging with contrast dependent on blood oxigenation. Proc Natl Acad Sci USA 1990; 94:68-78.

Autor
Cortesia de

Prof. Dr. Ricardo Gatass, MD, PhD
Área de Especialização: Ciências Biomédicas
Categoria: Titular
Sub-Reitor de Ensino para Graduação
Universidade Federal do Rio de Janeiro
 rgattass@chagas.biof.ufrj.br