Estimulação Cerebral Externa
Seu Uso no Tratamento de Doenças Nervosas e Mentais

Mario Celestino de Oliveira

Fone: 011-97289185

mariocelestino@ig.com.br

Tópicos:

Fisiologia do sono
Sintetizadores de ondas cerebrais
Como funcionaca
Evidências científicas
Aplicações clínicas
Exemplo de um caso clínico
Para saber mais
O autor

Muitas doenças nervosas e mentais podem se beneficiar de uma nova combinação terapêutica denominada Relaxamento e Controle de Aferência.  Ela surgiu como uma união entre duas tecnologias já conhecidas há bastante tempo de estimulação cerebral externa:

Neste artigo, pretendemos dar uma explicação resumida sobre cada uma dessas terapias e como elas funcionam, bem como relatar alguns casos reais tirados de nossa extensa experiência clínica com seu uso, que demonstram sua utilidade.

Fisiologia do Sono

Do ponto de vista neurofisiológico, sabe-se que os principais eventos acontecem durante o sono, são eles.
1 Deaferentaçao: este e um termos que significa perda, ou seja, o bombardeio constante de informações neurais vindas do exterior, através dos orgãos sensoriais, como visão, audição, olfato, gosto, tato, dor, pressão, temperatura, sensações profundas dos músculos, etc; que deixam de atingir o córtex cerebral e não são mais percebidas conscientemente;
2 Perda da consciência: todas as atividades conscientes, como auto-persepçao, vigília, alerta, atenção, pensamento, linguagem, cognição, etc; que são em grande parte realizadas pelo córtex cerebral, também sãodesativadas durante o sono;
O surgimento desses dois fenômenos ocorre principalmente como resultado da modificação da atividade de uma estrutura cerebral chamada formação reticular ascendente (fra, que é um conjunto de núcleos e fibras dispostos como peixes em uma rede de pesca, fica localizada no centro do tronco encefálico e caudalmente ela se dirige para a espinha dorsal e cranilmente para o diencéfalo. O tronco encefálico, e uma das partes mais basais e primitivas do nosso cérebro. A fra, recebe conexões derivadas de praticamente todos os grandes sistemas sensoriais do cérebro, e bombardeia, por sua vez, de forma continua, o córtex cerebral, mantendo a sua atividade. Na indução do sono, a fra, diminui a sua atividade consideravelmente, e inicia impulsos inibidores que vão promover a deaferentaçao. Isso ocorre por diversos fatores, como cansaço, ciclo, dia noite, e ate acumulo de algumas substancias químicas no sangue (e quando “sentimos sono”, como se diz popularmente). Dessa forma, a fra funciona como uma espécie de ¨portão sensorial”, como especifica a teoria mais conhecida, elaborada pelos neurologistas melzack e wall na década dos anos 70.
No mecanismo do sono, estão envolvidas dois importantes núcleos do tronco encefálico: os núcleos na rafe e o lócus coeruleos. Os núcleos da rafe por sua vez, tem dois componentes, situados na ponte e no bulbo cerebral. Os núcleos da ponte são inibidores do despertar, agindo no diencéfalo e no córtex. Os núcleos da rafe do bulbo tem uma ação mais tardia, aparecendo no controle dos movimentos dos olhos. A propagação desses impulsos acabam por atingir o lócus coeruleus caracterizando o sono profundo com sonhos.
Depois de um certo tempo de sono, esses impulsos inibidores começam a diminuir, dando abertura para que os estímulos sensoriais comecem novamente a ativar a formação reticular ascendente, o diencéfalo e o córtex ocasionando assim o despertar.
Para saber mais sobre a neurofisiologia do sono, leia o artigo da Dra. Silvia Helena Cardoso, nesta revista.

Sintetizadores de ondas cerebrais

As primeiras pesquisas cientificas sobre os efeitos da luz e som sobre o cérebro começam nos meados dos anos 30, quando cientistas descobriram que os ritmos do cérebro tendiam a assumir o ritmo de uma luz piscante, num processo chamado de condicionamento cerebral.
Desde a década dos anos 20, com a descoberta que e possível registrar-se a atividade elétrica do cérebro através de eletrodos externos e de um aparelho denominado eletroencefalógrafo (inventado pelo medico holandês Berg), sabe-se que os níveis de sono, sonho e vigília são associados às ondas cerebrais com frequências diferentes (veja a figura abaixo do artigo do Dr Renato m. E. Sabatini na revista cérebro e mente sobre o mapeamento do cérebro).


A pesquisa se acelerou no final dos anos 40, quando o grande neurocientista britânico w. Gray Walter, usou um estroboscópio e equipamentos de eeg avançado, para investigar o que chamou de ¨fenômeno de tremulação¨. Ele descobriu que luzes piscando ritmicamente alteravam rapidamente a atividade das ondas cerebrais produzindo estados semelhantes ao transe de relaxamento profundo e vivida visualização mental, e ficou surpreso que o piscar das luzes alterava a atividade das ondas cerebrais do córtex inteiro ao invés de apenas associadas à visão. Atualmente essa propriedade da indução visual estroboscópica e utilizada clinicamente para detectar crises epilépticas durante exames de eletroencefalografia, e se sabe que certos tipos de epilépticos podem sofrer crises ao serem estimulados por luzes piscantes na frequência elevadas medidas em Hrz.
Com base nesse conhecimento sobre o condicionamento externo da atividade elétrica cerebral, diversos pesquisadores desenvolveram equipamentos capazes de estimar o cérebro com pulsos luminosos e auditivos rítmicos, e começou-se a investigar seus efeitos sobre o nível de vigília, consciência, relaxamento, etc.
Dependendo se queremos estimular ou deprimir o snc, usam-se combinações diferentes de frequência. Geralmente, após cerca de 10 min, a atividade do cérebro entra em fase com o mesmo ritmo desses estímulos esternos.


Assim, esse mecanismo permite portanto a mudança a nível de consciência de forma passiva, sem exercício especifico e rapidamente.


Os aparelhos de síntese de ondas cerebrais mais comuns compõe-se de uma central micro computadorizada, que produz as seqüências de som e de luz, combinados em diversas sequencias (programas). Essas unidades podem ter diferentes complexidades, dependendo do numero de programas fixos e da capacidade de receber programações novas. O tipo mais comum de aparelho permite cinco programas, básicos que podem ser combinados com 10ritimos diferentes, gerando ate 50 programas. O paciente recebe as estimulações através de um par de fones de ouvido (programação auditiva), e de um óculos que contem 8 leds sendo 4 de cada lado em sua face interna.

Como funciona essa técnica

Partindo de tudo o que já foi dito, anteriormente, essa técnica é uma sofisticação da hipnose tradicional, convencional. Ela foi se aprimorando e tomando corpo sem modificar as suas essências, quando cientistas e pesquisadores começaram a perceber que as induções hipnóticas seriam mais rápidas e eficazes com a introdução de condicionamentos por instrumentos.
No condicionamento visual e feito através de óculos especiais compostos de leds vermelhos e azuis e com os olhos fechados ate o final da sessão que farão a função de baixar a atividade cerebral variando as frequências entre 0,5 a 50hz e com intensidade fixa.
 Explicaremos mais detalhadamente o porquê dos leds vermelhos e o porquê que podemos utilizar de forma opcional a luminosidade azul.
As cores não são apenas e tão somente cores, as cores na realidade são espectros de ondas eletromagnéticas que cada uma delas visíveis a olho nu, tem o seu comprimento de onda medido em milimicrons. Desde o infravermelho ate o ultravioleta.
Muitos podem perguntar o porquê de se usar o vermelho e não o verde , e porque temos um opcional que e o azul?
Tudo que foi falado e pura física, ou seja, não existe nada fora à física e a eletricidade.
A luminosidade vermelha possui um comprimento de onda de 800 milimicrons e transportando isso para a neurofisiologia, ou seja para o processo terapêutico, ela tem a propriedade de penetração cortical mais intensa devido ao seu comprimento e quando se pede para fechar os olhos na sessão, e porque a pálpebra ira servir de difusor para a luminosidade para dentro dos olhos em que esse estimulo visual vai ser captado pelos fotorreceptores transformando-os em estimulo elétrico que caminhara para o tronco encefálico e depois para o córtex cerebral para ser interpretado.
Já a luminosidade azul, possui um comprimento de onda de 400 milimicrons e consequentemente a penetração cortical e menor, porém psicologicamente trazemos informação de nossos antepassados de que o azul acalma, e é tranquilizante e ansiolítico. Quando usamos a luminosidade azul , fisiologicamente ela penetrara menos do que a vermelha, mas o efeito psicológico impregnado em nossos valores culturais da o tom .
Então recapitulando, o objetivo desse condicionamento e diminuir a atividade cerebral a níveis alfa e abaixo dele, níveis este, que podemos encontrar um simples relaxamento ate um sono profundo, afinal de contas o sono e a inibição protetora do córtex e o que fazemos e a intensificação dessa inibição.
No condicionamento auditivo, que e a variável mais importante do processo hipnótico, o paciente recebe através de um fone de ouvido um programa pré-elaborado, minuciosamente estudado, com detalhes específicos para uma determinada patologia a fim de que ao ser interpretado a nível de córtex a remoção dos estímulos negativos seja praticamente modificada por novas conecções neurais, ou seja, iremos controlar e selecionar os estímulos através dos sintetizadores e do fone evitando ao máximo aquelas variáveis indesejáveis que dificultam o tratamento.

Evidencia cientifica

As duas fotos abaixo representam imagens computadorizadas da atividade cerebral de um mesmo individuo mostrando a influencia radical do sintetizador nos ritmos cerebrais, com apenas 12 minutos de uso. As cores nestas imagens, significam intensidade de ondas cerebrais especificas e sua distribuição nas diversas áreas cerebrais, ou seja, baixa intensidade media.
Na parte superior da imagem, o paciente esta com os olhos fechados e as figuras 1 e 3 apresentam a atividade alfa (9 a 13 ciclos por segundo), principalmente localizada na região occipital (parte superior do cérebro, onde existe o córtex visual). Na figura 2 apresenta-se a frequência teta, localizada predominantemente no terço trazeiro do encéfalo.
Na parte inferior da imagem esta ilustrada a parte cerebral depois de usar o sintetizador por 5 min. A atividade alfa (figuras 1 e 3) espelhou-se por quase toda a totalidade do cérebro. A atividade teta (figura 2) aumentou visivelmente e tornou-se centralizada.


Aplicações clinicas

Em nossa clinica temos experimentado com o uso da técnica, por luz e som, para o tratamento de diversas condições patológicas, tais como depressão, ansiedade, síndrome do pânico, stress pós-traumático, algumas psicoses, obesidade e também dependência química na qual cai no mesmo esquema de novas aprendizagens para se ter novos comportamentos, ou seja, fazem novas redes neurais.
Os resultados ate o momento tem sido extremamente positivos, pois estamos introduzindo uma conduta terapêutica não invasiva, pelas invasivas e no mínimo, substituímos gradativamente os psicotrópicos favorecendo assim uma menor incidência de efeitos colaterais dos mesmos. Atualmente as pesquisas cientificas mais atualizadas mostram o quanto estamos avançando nos processos não invasivos tais como as estimulações magnéticas transcraniana e ate a antiga eletroterapia transcerebral que já falávamos há anos atrás, estão em franco desenvolvimento em grandes universidades do pais.

Exemplo de um caso clinico

Paciente de sexo feminino, diagnosticada com esquizofrênica, começou a apresentar comportamentos estranhos, segundo seus pais. Com o decorrer dos dias , começou a apresentar alucinações auditivas, medo, e aversão a ruídos
Posteriormente passou a apresentar muita sonolência diurna, pouca conversa, ganho de peso e muita agressividade. Sem falar com ninguém, começou a dormir pouco e durante o dia apresentava-se hipotimica, incontinência emocional, muito nervosismo e muita teimosia. Com o agravamento da doença, passou a sair de casa a noite e perambular pelas ruas , extravasando a sua agressividade danificando o carros que ali estavam.
Foi internada em maio de 1999, submetendo-se as sessões de ect. Depois da alta, passou a frequentar o proesq, entidade ligada a UNIFESP e em setembro de 99 começou o tratamento ambulatorial com a hipnoterapia cognitiva. Logo na primeira sessão já se podia observar uma melhora bastante significativa. Atualmente ela mantem as sessões de 15 em 15 dias e tem uma vida praticamente normal, guardando as devidas proporções.

Para Saber Mais

  1. Frequently Asked Questions about Cranial Electrotherapy Stimulation (CES)
  2. Cranial Electrotherapy Stimulation (CES): A Very Safe and Effective Non-Pharmocological Treatment for Anxiety. A Review of the Literature, by Lawrence Paros, Ph.D. and Daniel L. Kirsch, Ph.D., D.A.A.P.M.
  3. Klawansky, Sidney et al. Meta-analysis of randomized controlled trials of cranial electrostimulation: efficacy in treating selected psychological and physiological conditions. Journal of Nervous and Mental Diseases, 183(7):478-485, 1995.
  4. Cardoso, Silvia Helena: Entendendo os Sonhos. Revista Cérebro & Mente, junho-agosto 1997.
  5. Chaves, J.: Biofeeedback: A Terapia do Século 21. Revista Cérebro & Mente, dezembro 1997-fevereiro 1998.
  6. Sabbatini, R.M.E.: Mapeando o Cérebro. Revista Cérebro & Mente, setembro-novembro 1997.
  7. Bertolini, c.a. Ensino de física (luz e cor)
  8. Krech & crutchfield, elementos da psicologia, 1971 pgs 74, 90 a 93
  9. Lewerenz, coal t., “a factual resport on the brain wave synchronizer,  hipnosis quartely, vol . No 4, 1963.
  10. Letter to the editor,  hipnosis machine, journal of american. Medical association, march 21, 1959
  11. Morse, d. R. “ brain wave synchronizers: a review of their stress reduction effects and clinical studies assessed by questionnaire, galvanic skin resistance, pulse rate, saliva, andelectroencephalograph, ” stress medicine 9: 111-126, 1993.
  12. Anderson, d.j.,  “ the treatment of migraine with variable frequency photo-stimulation” headache, 29: 154155, 1989. 644
O Autor

Mario Celestino de Oliveira
Psicólogo clínico, radicado em São Roque, SP.
O autor agradece a colaboração do Dr. Renato M.E. Sabbatini na correção e editoração final deste artigo.
Email para contato: mariocelestino@ig.com.br
 
 
 

Copyright 2002 Universidade Estadual de Campinas
Publicado na Revista Cérebro & Mente
Uma iniciativa: Núcleo de Informática Biomédica da UNICAMP